Por Valmir Lima e Feifiane Ramos, do ATUAL
MANAUS – Depois do pedido de afastamento do deputado estadual Sinésio Campos (PT) do cargo de presidente do Diretório Estadual do PT no Amazonas, por ter confessado ser dele o dinheiro apreendido pela Polícia Federal em poder de um assessor do parlamentar às vésperas do primeiro turno das eleições municipais deste ano, outras informações sobre o dinheiro do fundo eleitoral vêm sendo discutidas internamente e um documento que veio à tona neste fim de semana requer explicação da direção estadual.
O ATUAL teve acesso a um documento do Diretório Estadual em que a direção do partido responde a um pedido de informação do Diretório Municipal de Manaus e contesta a informação de que o Diretório Nacional teria repassado mais de R$ 3 milhões para bancar a campanha de candidatos e candidatas a prefeito, prefeita, vice-prefeito, vice-prefeita, vareador e vereadora nos 61 municípios do interior do Amazonas. O dinheiro para os candidatos de Manaus é repassado direto da Executiva Nacional.
“Conforme documento enviado para a nacional [diretório nacional] sem qualquer assinatura das pessoas que elaboram, o diretório estadual recebeu R$ 3.300.000,00 para destinar aos municípios. O documento informa ainda que não há clareza sobre a destinação e que não foi discutido na executiva estadual a forma de distribuição dos recursos (sic)”, diz o documento produzido pelo secretário de finanças Thiago Medeiros.
Em seguida, ele esclarece que não foram repassados R$ 3,3 milhões, mas apenas R$ 1.873.732,05. “A primeira parcela recebida foi no valor de R$ 1.571.611,21 e, conforme documento enviado pela própria nacional no dia 02/09/2024, o valor da segunda parcela seria de R$ 302.120,84”.
Os valores das duas parcelas, segundo o secretário de finanças, foram repassados a quatros contas bancárias do Banco do Brasil pertencentes ao Diretório Estadual.
O partido também contesta a reclamação de que não houve transparência na distribuição dos recursos aos diretórios municipais do interior do Estado, e diz que a partilha foi feita conforme decidido em reunião realizada no dia 14 de agosto deste ano. Nessa mesma reunião foi informado que a previsão de repasse da nacional seria de R$ 3,3 milhões, o que não se confirmou, segundo o documento do PT estadual.
De acordo com o partido, 65% (R$ 1.217.925,83) seria para repasses individuais (candidatos e candidatas a prefeito, prefeita, vice-prefeito, vice-prefeita, vereador e vereadora) e 35% (R$ 655.806,22) para estrutura coletiva (material de campanha, contador e advogado para candidatos e candidatas).
Desentendimentos
A briga pela partilha dos repasses, no entanto, começou no início de setembro. O documento do Diretório Estadual informa que “No dia 02/09/2024 foi convocada uma nova reunião da Executiva Estadual onde tinha como pauta exclusiva (sic) fundo eleitoral partidário, mas a reunião acabou sendo suspensa devido alguns membros iniciar de forma gratuita ataques ao presidente e tesoureiro do partido (sic)”.
O dinheiro foi dividido, segundo o Diretório Estadual, por uma ordem de classificação de candidatos feita pelos diretórios municipais. Esses diretórios indicaram quanto cada candidato a prefeito e vice-prefeito receberiam, e quais candidatos a vereador teriam direito aos repasses, assim como o valor destinado a cada um.
Partilha questionada
A partilha foi questionada, principalmente porque houve algumas disparidades. Em Itacoatiara, por exemplo, onde o PT tinha quatro candidatos, apenas uma candidata recebeu recursos (R$ 60 mil, o maior valor recebido por um candidato a vereador do partido e mais do que foi repassado a quatro candidatos a prefeito no interior do Estado).
A candidata é Cheila Moreira, que ficou como terceira suplente da Federação Brasil da Esperança (PT, PV e PcdoB), com 596 votos. A federação elegeu apenas um candidato em Itacoatiara: A I Netto, do PV.
O dinheiro não foi distribuído para todos os candidatos. Na lista do Diretório Estadual, estavam 27 candidatos a vereador que disputavam a reeleição. Os valores variavam de R$ 7 mil a R$ 11 mil para cada candidato, exceto para Cheila Moreira, que recebeu R$ 60 mil.
Dos 27 candidatos que tentavam a reeleição, cinco não têm registro no site do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de recebimento de qualquer recurso pelo Diretório Estadual, apesar de estarem na lista. Entre eles estão Arsenio Tikuna e Bruno da Pesca, do município de Benjamin Constant. Ambos foram eleitos, mas não há qualquer informação sobre receita ou despesa no DivulgaCandContas, do TSE.
Dinheiro apreendido
O que motivou o pedido de afastamento de Sinésio Campos foi a apreensão de R$ 20 mil em espécie que estava com o assessor parlamentar dele. O dinheiro iria para o município de Benjamin Constant. Lá, além dos candidatos a vereador eleitos, que deveriam ter recebido R$ 8 mil cada um, o candidato a vice-prefieto João Vieira da Silva, o Negão, que estava na lista para receber R$ 20 mil, também não tem registro de recebimento no TSE.
Além de Negão, outro candidato a vice-prefeito, Telles Dias, de Boa Vista do Ramos, não recebeu os R$ 20 mil previstos na lista do Diretório Estadual.
Entre os prefeitos, alguns também não receberam o valor total da lista: Curubinha, de São Gabriel da Cachoeira recebeu R$ 50 mil, dos R$ 65 mil prometidos. O mesmo ocorreu com Anderson, de Manicoré, e com Marquinho Abreu, de Uarini.
Duas candidatas a prefeita receberam valores acima do previsto: Edjane da Silva, de Tefé, recebeu R$ 85 mil, de R$ 65 mil previstos; Preta, de Manaquiri, recebeu R$ 89 mil.
Vereadores
O dinheiro destinado aos vereadores também não aparece em todos perfis de candidatos no DivulgaCandContas (Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais) do TSE, onde todos os valores recebidos e gastos devem ser registrados em tempo real, por exigência legal.
Dos R$ 274 mil destinados aos 27 candidatos a vereador que disputavam a reeleição, apenas R$ 191 mil chegaram aos candidatos, conforme as informações registradas no site do TSE (veja lista abaixo). Cinco deles não tem qualquer valor recebido.
Entre os 69 candidatos a vereador que disputavam uma vaga e que foram listados para receber recursos, oito não receberam. A candidata Lourdes Quilombola, de Barreirinha, aparece duas vezes na lista, uma com o nome de registro civil: Maria Amélia. Mas ela recebeu apenas uma vez: R$ 4 mil.
O ATUAL consultou membros do Diretório Estadual e do Diretório Municipal de Manaus sobre a possibilidade de os recursos de candidatos que não receberam terem sido destinados a outros candidatos ou a outras despesas “estrutura coletiva”. A informação é de que o remanejamento só pode ser feito se for decidido pela Executiva Estadual, mas não houve reunião para deliberação desse tema.
O que diz Sinésio Campos
Questionado pelo ATUAL sobre a diferença de valores recebidos por alguns candidatos em comparação a outros que não receberam ou tiveram valores menores, Sinésio Campos afirmou que a decisão sobre a “distribuição do fundo partidário” é feita pelo Diretório Nacional e segue critérios do partido. “Por exemplo, se esse filiado [candidato] ao PT estiver devendo, é suspenso o repasse a ele, que está ‘previsto’”, explicou.
De acordo com Sinésio, nesta eleição houve uma diminuição no repasse de recursos destinados ao PT do Amazonas e a outros estados, uma vez que a Direção Nacional deu “prioridade a São Paulo, à candidatura de [Guilherme] Boulos”. Assim, segundo ele, o que estava previsto para o estado não foi repassado.
Os valores não recebidos por alguns candidatos “foram remanejados” para outros, disse Sinésio Campos, citando mais uma vez que todos os critérios foram definidos pela “Nacional e não pelo Diretório Estadual”. Ele finalizou afirmando que “não sobrou dinheiro nenhum” e que isso ficará evidente quando houver a prestação de contas do partido.
O presidente do PT também criticou a divulgação das listas de candidatos com os valores de repasses definidos pelo partido. “Essa lista foi divulgada por irresponsáveis”, afirmou. Segundo ele, o documento é apenas uma previsão e não significa que os valores serão repassados a todos os candidatos como está previsto.
Abaixo, o documento do Diretório Estadual do PT.