Do ATUAL
MANAUS — As propriedades medicinais das plantas amazônicas são conhecidas, mas o potencial para outros produtos além de fármacos ainda é pouco explorado. A produção de tintas é um deles. A vantagem, além de cores vibrantes, é a composição química sem qualquer substância de risco ao meio ambiente e aos seres humanos.
Especialista em tintas naturais, a comunicóloga e artista multimídia Michelle Moraes elaborou uma cartilha em que ensina a produção de tintas naturais. A publicação “Biotintas da Amazônia — Introdução ao Universo das Tintas Naturais” é gratuita e está disponível online. A intenção de compartilhar o conhecimento é promover alternativas ecológicas na criação artística e valorizar os saberes tradicionais da floresta, disse a também empreendedora.
A cartilha é destinada a arte-educadores, artesãos, comunidades tradicionais, educadores ambientais e todos aqueles interessados em práticas sustentáveis.
Michelle explicou ao ATUAL que o interesse pelo tema surgiu da própria experiência artística, que busca alinhar as produções dela ao respeito ao meio ambiente. “Sou uma pessoa que se preocupa com as causas ambientais e essa vontade de trabalhar com um processo mais natural e menos poluente me faz estar sempre atenta e pesquisando possibilidades de utilizar processos mais coerentes com meus ideais e me aproximar mais da natureza”, afirmou.

A artista disse que o objetivo da cartilha é contribuir para o resgate e a valorização de um saber milenar, transmitido de geração em geração. “Queria contribuir com o resgate e valorização desse conhecimento milenar, que já era praticado desde nossos ancestrais e compartilhar isso com mais pessoas. Sinto que está se perdendo. Acredito que só compartilhando é possível manter esses conhecimentos tradicionais. É preciso torná-lo acessível”.
A publicação detalha o processo de produção das biotintas a partir de dez plantas: açafrão, açaí, cacau, caju, crajiru, erva-de-passarinho, goiaba, jenipapo, saratudo e urucu. Michelle explica que, embora inicialmente quisesse priorizar em plantas nativas, optou por incluir também espécies adaptadas à região.
“A princípio queria que fossem plantas reconhecidamente nativas, mas depois fiz uma junção com as plantas que não são originárias, mas que se adaptaram à nossa região e são facilmente encontradas. Não teve um critério rígido na escolha das plantas. Escolhi aquelas que tenho em casa e outras que fui conseguindo nas áreas em que fui visitando […] pretendo desenvolver outra edição com novas plantas que não entraram, mas que eu já sei do potencial tintório”, revelou.
Além de orientar sobre o preparo das tintas, a cartilha ensina a escolher aglutinantes, fixadores e conservantes naturais. A idealizadora cita ainda que o material pode ser útil em diversas atividades, como oficinas, projetos de educação ambiental e ações socioculturais.
“Aprender sobre tintas naturais é mais do que querer pintar ou tingir algo, é saber que nosso ecossistema é riquíssimo, que podemos utilizá-lo de uma forma equilibrada, com responsabilidade, sem precisar contaminar ou destruir o meio ambiente. É importante que tenhamos consciência das riquezas naturais que nos rodeiam. Através desse conhecimento, acaba surgindo um amor pelas plantas, surge a vontade de plantá-las e cultivá-las, trabalha nossa sensibilidade, a criatividade e conexão com a natureza. Isso é muito saudável para os dias de hoje”, declarou Michelle.
Michelle explica que a cartilha “tinha o objetivo de ser uma introdução, uma porta de entrada para o universo das tintas naturais”. Ela espera que a contribuição chegue ao maior número possível de pessoas. Embora a cartilha tenha sido pensada para ser um material inicial, ela acredita que vai além do básico.
Michelle espera que a cartilha incentive as pessoas a aprenderem mais sobre o uso de plantas da região amazônica, perceberem seu valor e, quem sabe, até se arriscarem a fazer as próprias tintas. Para ela, esse trabalho também está ligado ao resgate da nossa cultura e identidade, já que os indígenas utilizam as plantas da floresta para a produção de tintas há muito tempo.
Michelle diz que pretende trabalhar na aplicação desse conhecimento de forma prática, com a criação de produtos de moda e design com a “cara da Amazônia”. “É um mundo de possibilidades. Depois, tudo poderá ser registrado e transformado em publicações”.
O projeto foi contemplado com recursos da Lei Paulo Gustavo, com incentivo do Conselho Municipal de Cultura (Concultura) e da Prefeitura de Manaus.
A cartilha pode ser baixada clicando aqui.